Impactos tributários da mudança na contabilidade
A edição da Lei 11.638/07 promoveu profundas mudanças na estrutura e conceitos da contabilidade no Brasil
A edição da Lei 11.638/07 promoveu profundas mudanças na estrutura e conceitos da contabilidade no Brasil, via alteração de dispositivos da Lei das Sociedades Anônimas (Lei 6.404/76), com reflexos na apuração dos resultados das empresas.
Sem entrar no mérito da discussão quanto às virtudes e defeitos do novo modelo contábil adotado, temos que o principal objetivo foi o de alinhar os critérios e formas de elaboração das demonstrações financeiras das empresas sediadas no Brasil àqueles que mais recentemente vêm sendo adotados no exterior.
É evidente que o processo de adaptação, sobretudo em matéria envolvendo tantos pontos e detalhes técnicos, não poderia ser levado a termo sem a necessária fase de assimilação e tratamento das mudanças.
Sob o aspecto tributário, a consequência mais flagrante foi que a alteração de normas — que certamente afetariam o lucro contábil, ponto de partida para a base de cálculo dos tributos diretos, casos do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido — igualmente modificaria os valores devidos a título desses tributos. Assim, uma das primeiras e mais sensíveis questões que surgiram foi quanto aos reflexos e impactos tributários decorrentes das medidas que a nova lei estabeleceu.
Muito embora a própria Lei 11.638/07 (art. 1º, § 7º) trouxesse expressa disposição no sentido de que os ajustes efetuados exclusivamente para harmonização das normas contábeis e das demonstrações e apurações com elas elaboradas não deveriam surtir efeitos tributários, muitas foram as dúvidas que ainda permaneceram no curso do ano de 2008.
Para suprir eventuais lacunas legais e esclarecer o procedimento a ser adotado, afastando entendimentos indesejados, em dezembro de 2008 foi publicada a Medida Provisória 449, já promovendo mudanças na própria Lei 11.638/07 e estabelecendo, dentre outras tantas alterações da legislação tributária, em seus artigos 15 a 22, o Regime Tributário de Transição (RTT).
O RTT trata dos ajustes tributários decorrentes da nova metodologia contábil introduzida pela Lei no 11.638/07 e pelos artigos 36 e 37 da própria MP 449/08, estabelecendo neutralidade tributária para as eventuais diferenças de valores apuradas em decorrência da adoção dessas novas normas contábeis.
Conforme disposto no parágrafo 1º do artigo 15 da MP 449/08, o RTT “vigerá até a entrada em vigor de lei que discipline os efeitos tributários dos novos métodos e critérios contábeis, buscando a neutralidade tributária”.
Os artigos 16 e 17 da MP 449 determinam que os resultados tributários continuarão a ser apurados de acordo com as normas, métodos e critérios contábeis vigentes em 31 de dezembro de 2007, devendo os ajustes ser procedidos no Livro de Apuração do Lucro Real (Lalur).
Contudo, o novo regime será optativo nos anos de 2008 e 2009, sendo a opção irretratável, devendo abranger os dois anos conjuntamente, e ser manifestada, obrigatoriamente, por ocasião da entrega da Declaração do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (DIPJ).
Evidentemente, as próprias instruções de preenchimento da DIPJ do Exercício 2009 devem orientar quanto ao procedimento para a opção: se deverá ser assinalada determinada quadrícula ou preenchida uma “ficha” específica da DIPJ.
Assim, além dos cuidados normais no preenchimento da DIPJ, há ainda a necessidade de especial atenção em relação à opção pelo RTT (se esta for a intenção da empresa declarante, é claro).
Embora a afirmativa acima possa parecer óbvia, temos verificado várias situações em que a não observância de pequenos detalhes quando do cumprimento de obrigações acessórias gera dissabores e prejuízos aos contribuintes, criando entraves ao aproveitamento de créditos válidos ou gerando contingências fiscais de todo evitáveis se observadas as determinações da legislação tributária.
Também é fato que não têm sido aceitas pela Receita Federal as alterações de declarações que visem incluir ou alterar opções anteriormente manifestadas ao Órgão.
Por fim, caso não manifesta a opção pelo RTT na forma como determinada, eventuais reflexos tributários decorrentes da adaptação à Lei 11.638/07 deverão ser considerados na base de cálculo dos tributos, já no ano-calendário de 2008 e seguintes.